Não existe adversário político que ouse enfrentar o
“Grande Chefe”, que se sente à vontade para nomear parentes em altos
cargos públicos sem concurso e sem merecimento; ele acha que pode
bisbilhotar a vida dos inimigos fazendo uso de homens, armas e da
estrutura do exército imperial, mas os milionários matogrowskianos
apoiam integralmente o seu “Soberano”, inclusive porque ele não cobra
impostos dos ricos e poderosos, mas o faz sem dó nem piedade contra os
desempregados, os subempregados, escravos assalariados, enfim, dos
pobres em geral.
Eu não sei de onde vem essa história, ou se trata apenas de uma simples
estória, um conto “Matogrowskyssense”, oscilando entre o real e o imaginário.
Mas, como dizia um conterrâneo lá das bandas do meu querido nordeste, o Chicó:
“Não sei, só sei que foi assim!” Chicó, ao contrário do que muitos pensam,
realmente existiu e viveu no sertão paraibano de Taperoá e foi imortalizado na
peça teatral (que virou filme) “Auto da Compadecida”, escrita por Ariano
Suassuna, em 1955.
Não sei se é real, mas aconteceu assim, diria Chicó:
Dizem que existe, em um espaço qualquer do mundo, um império bolivariano
conhecido por “Matogrowsky”, uma porção de território comunista onde os seus
ricos camponeses, verdadeiros senhores feudais, cultivam algumas variedades de
produtos tóxicos que são lançados em negócios internacionais e vendidos a
outros países.
Esses camponeses matogrowskianos, proprietários de grandes latifúndios, são
tão comunistas como o seu “Comandante Maior”, e dele têm a total proteção, é
tanto que, não apenas desmatam as florestas, o serrado, agridem toda a região
pantaneira, como ainda tentam regulamentar o trabalho escravo e lançam
impunemente uma enormidade de dejetos tóxicos nas águas dos rios daquele
Império. E isso vem gerando algum desconforto na população, porque o número de
pessoas com câncer vem aumentando, mas o Imperador faz de conta que não é com
ele.
Não existe adversário político que ouse enfrentar o “Grande Chefe”, que se
sente à vontade para nomear parentes em altos cargos públicos sem concurso e
sem merecimento; ele acha que pode bisbilhotar a vida dos inimigos fazendo uso
de homens, armas e da estrutura do exército imperial, mas os milionários
matogrowskianos apoiam integralmente o seu “Soberano”, inclusive, porque ele
não cobra impostos dos ricos e poderosos, mas o faz sem dó nem piedade contra
os desempregados, os subempregados, escravos assalariados, enfim, dos pobres em
geral. Dizem até que ele é a reencarnação do Rei Luís XIV, apelidado de "o
Grande" e "Rei Sol", aquele que dizia: "L'État c'est moi"
(O Estado sou eu).
Ultimamente, uma família de conhecidos salteadores, que há muito vinha
saqueando o Império matogrowskiano, tenta fazer um arremedo de oposição ao
“Todo Poderoso”, ainda que quase sempre caia em contradição. É que os desejos
de ambos, o do atual Comandante Imperial e os dos membros da antiga facção
criminosa, sempre foram o de lançar as mãos sobre o dinheiro do tesouro real.
Dia desse, ao fazer uma tentativa de oposição, um dos membros daquela
quadrilha, cujo chefe responde a mais de 100 processos, e é conhecido em toda a
região e países circunvizinhos como o rei da “Ficha Suja”, questionou a
sexualidade do Imperador, fato este, que resultou em revolta popular contra a
fala discriminatória de uma das descendentes do “Ficha Suja Mor”. Apenas um
religioso conservador, ligado ao partido do ultradireitista, deputado
Bolsonewsky, que defende uma ditadura militar mundial, gostou da crítica e
vibrou aos gritos de “abaixo a ditadura gaysista”!
Parece que o “Grande Rei” vem fazendo umas “pedaladas”, termo bastante usado
naquele “Império Comunista” para descrever a conduta de gestão de pegar
dinheiro separado para uma prestação de carnê não vencido, e quitar uma dívida
que estava indo para o Serasa das Contas Imperiais.
Por exemplo, para quitar o soldo dos soldados e pagamento de seus vassalos,
o “Reencarnado Rei Sol” guardava uma reserva de 60 milhões de unidades
monetárias, e usou esse valor para quitar dívida com os Centros de Curas de
Enfermos que já estavam sem remédios para conter o escorbuto e a malária,
moléstias que assolam o império matogrowskiano. Os adversários do Imperador
chiaram, dizendo que esse tipo de gestão de recursos financeiros levou a
cassação do mandato de uma política ultradireitista no reino capitalista
vizinho a Matogrowsky. Dizem que a tal “dama de ferro” teria cometido uma coisa
chamada “pedalada fiscal”. Por isso foi encaminhada ao cadafalso, tendo o
pescoço decepado em praça pública. O Imperador matogrowskiano fez exatamente o
mesmo em seu reino, tirando dinheiro do pagamento de salários para socorrer as
despesas com os doentes; já a sua colega do país vizinho tinha retirado
dinheiro de bancos para entregar aos pobres e camponeses.
“Foi decapitada, bem feito!”, disse rindo o Imperador na época da desgraça
da vizinha que ele próprio ajudara a decapitá-la.
Hoje, as nuvens estão densas sobre ele, eis que foi recentemente flagrado
tirando dinheiro da escola dos órfãos e o destinando aos seus vassalos mais
próximos, que se incumbem de lhe dar uma vida de luxo, ostentação e
facilidades. Os órfãos tentaram reclamar por meio de seus pais e de entidades
populares, mas foram “grampeados” e ameaçados pelo exército a serviço do
Imperador.
Mas o pior é que um namorado da antiga ama de leite de um dos ministros do
Imperador teve seu sigilo invadido, porque foram instalados aparelhos
rudimentares em seus aposentos visando saber quais são as suas atividades na
alcova (isso se chama “grampo”). O caso vem gerando grande repercussão em
Matogrowsky, e já há quem fale sobre uma possível cassação do “Imperador
Comunista” e a sua execução em praça pública, tal como ocorreu um ano antes com
a sua colega capitalista da nação vizinha. Mas, o Soberano matogrowskiano não
está nem aí pra isso, afinal de contas, "L'État c'est moi" (O Estado
sou eu), pensa ele.
E se não for verdade? Se, na realidade, o “Todo Poderoso Rei Luís XIV
Reencarnado” for apenas um simples mortal, que mal faz? “É sempre assim: depois
de morrer, todo mundo fica bonzinho!” disse satanás na peça O Auto da
Compadecida. Enquanto isso, ele é livre para continuar pedalando e cometendo
crimes.
E aquelas tantas promessas não cumpridas pelo Supremo Monarca de Matogrowsky
antes de assumir o Trono, como é que ficam? Pode alguém da plebe (os comedores
de mortadela) se perguntar. E é aí que ele, o Iluminado Soberano, deve ficar se
contorcendo como o João Grilo na peça de Ariano Suassuna: “Ô promessa
desgraçada! Ô promessa sem jeito!”.
Como alguém pode chamar de “Império Comunista” e de “bolivariano” um Estado
dominado por ricos latifundiários e empresários bilionários? Perguntarão também
os atônitos “baderneiros e vândalos dos movimentos revoltosos” (como a Mídia do
Imperador costuma apelidar, aqueles que não se curvam à tirania dos poderosos).
Não sei se tudo isso é verdade ou fantasia, diria Chicó, mas acho que é
assim que está acontecendo.
Antonio Cavalcante Filho é sindicalista e escreve neste espaço às
sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com
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