terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Psicologia de Corrupção

 Transtorno social:
 "A falta de moral pode ser explicada por meio do desenvolvimento inadequado do "senso ético" no cérebro, mas aspectos socioantropológicos, fatores genéticos e pessoais também colaboram para o surgimento do transtorno de personalidade difícil de ser curado"

Por Agência Noticia de Jornalismo Científico


 Psicologia de Corrupção

 
Corrupção, segundo consta no dicionário on-line Michaelis, vem do latim corruptione e tem por significados “ação ou efeito de corromper”, “decomposição”, “putrefação”, “depravação”, “desmoralização”, “devassidão”, “sedução” e “suborno”. A palavra se tornou comum e mesmo vulgar no vocabulário dos brasileiros após os inúmeros escândalos, envolvendo personalidades e políticos, divulgados pelos meios midiáticos nos últimos tempos.

Porém, a discussão sobre suas causas e origens diverge entre diversos fatores apontados por especialistas. A psiquiatra forense Hilda Morana, coordenadora do departamento de Psiquiatria Forense da Associação Brasileira de Psiquiatria, define o termo no seu sentido social. Para ela, corrupção é “ato de cometer atitudes ilícitas com o intuito de conseguir vantagem financeira ou mais poder”. Segundo Hilda, o típico corrupto é “o indivíduo que busca driblar regras em benefício próprio, sem levar em consideração outras coisas que não o próprio benefício”.

Ela afirma que esse tipo de comportamento é causado por um transtorno de personalidade, que, especificamente, pode ser definido de forma mais clara como um defeito do caráter. “É o chamado transtorno de personalidade antissocial. O indivíduo que possui o transtorno de personalidade antissocial não foi capaz, ao longo do tempo em que ocorreu o desenvolvimento de seu cérebro, de desenvolver adequadamente o ’senso ético’.

Ele não é capaz de respeitar o outro em sua plenitude, espontaneamente”, afirma. Hilda diz que esse distúrbio é causado por falhas cerebrais, mais especificamente, “por falhas do desenvolvimento cerebral em áreas frontais, chamadas suborbitárias, que muitas pesquisas apontam como sendo as regiões do cérebro responsáveis pela formação do ’senso ético’, e também da assimilação da moral estabelecida.

Ou seja, é ‘um defeito de fabricação’”. Se o indivíduo apresenta esse problema em algum momento da vida, muito provavelmente vai morrer com ele, e até mesmo tratamentos modernos contra o transtorno de personalidade não apresentam resultados 100% garantidos na recuperação”.



Parentes envolvidos


A especialista acredita que o quadro é parte de um conjunto de outros distúrbios, denominados transtornos de desenvolvimento. Entre eles, Hilda cita o retardo mental, que é um distúrbio que afeta de forma mais ou menos séria as áreas responsáveis pelo desenvolvimento intelectual do indivíduo, e o autismo, que afeta as áreas do cérebro responsáveis pela fala, pela sociabilidade e também pode afetar as áreas responsáveis pelo desenvolvimento intelectual.

“Por sua vez, o transtorno de personalidade provoca uma deficiência no caráter, em decorrência de má-formação das áreas do cérebro responsáveis pela sensibilidade moral”, declara. A psiquiatra forense argumenta que, para ela, há poucas dúvidas sobre o caráter herdado do distúrbio. Ela diz que sempre há pelo menos um parente que também está envolvido em alguma operação ilícita ou em alguma trapaça, embuste ou situação similar.

“O caráter herdado da doença é inquestionável. Nem sempre o outro indivíduo afetado é um parente direto, como um pai ou uma mãe. Às vezes um tio, ou primo. Mas é certo que, se o indivíduo apresentou em algum momento esses sintomas, é possível encontrar outros afligidos pelo quadro na família”. Para Hilda, a corrupção pode ser diagnosticada a partir do consultório.

Ela explica que é possível determinar a presença do distúrbio por meio do exame Pet Scan, ou tomografia por emissão de pósitrons, e que “o método revela com clareza a área suborbitária afetada pelo distúrbio do desenvolvimento. A gravidade do quadro pode variar muito. A gradação do distúrbio altera entre ‘leve’ até ‘muito grave’, e permite enquadrar a maioria dos criminosos e transgressores. Por exemplo, um quadro ‘leve’ pode se adequar a um oportunista que realiza pequenos delitos. Já um caso muito grave pode representar um político que realize grandes perseguições ou até mesmo um genocídio, como um ditador”.


Sem cura


Entre as causas do problema, a psiquiatra aponta o fator genético. Mas, ao mesmo tempo, ela declara que não há apenas um gene responsável pelo quadro, mas uma interação entre genes responsáveis pelo desenvolvimento cerebral. E por outro lado, há também as pressões ambientais.

“A má-formação das regiões suborbitárias do cérebro em decorrência desse distúrbio do desenvolvimento é consequência não só de um gene específico, ou de uma pressão ambiental. É uma interação genético-ambiental, uma associação de genes e ‘fatores desencadeadores’. Ou seja, em dois gêmeos univitelinos, existe a possibilidade de que um apresente o problema, e outro não”.

Quanto ao comportamento do indivíduo afetado, Hilda declara que “o portador do distúrbio tem plena consciência da natureza criminosa e funesta de seus atos, mas não apresenta remorso ou hesitação, exceto quando a ação pode trazer algum mal considerável para ele mesmo. Para ele, vale o ‘dane-se o resto’”. E acrescenta: “na linguagem popular, é ’safadeza’ mesmo, oportunismo, falta de moral, ética e escrúpulos.

Esse personagem é constantemente atraído para situações em que se conhecem possibilidades de obtenção de vantagens diversas com facilidade, e por isso a proliferação desses indivíduos no meio político”. Ela declara que “essa situação não é exclusiva do Brasil,percebe-se esse padrão no mundo. Estatísticas recentes apontam que cerca de 15% da população mundial é afetada pelo transtorno. Entre todos os casos, os mais graves, que podem responder por crimes mais sérios, orbitam entre 1% e 2% desses indivíduos. Estes, quase que obrigatoriamente, cometerão atos cruéis de algum tipo: grandes golpes que podem afetar muitas pessoas, torturas, assassinatos bárbaros para obtenção de fortunas, etc.”.

A psiquiatra lamenta que não existam medicamentos com resultados satisfatórios contra o transtorno. “Alguns até apresentam efeitos moderados e podem mesmo melhorar o funcionamento da região afetada, mas nunca acabar com o comportamento patológico”, diz. Para ela, uma solução adequada para o problema é “o fim da permissividade excessiva para com a corrupção política”.

Hilda afirma que “o portador do transtorno conhece as consequências possíveis de seus atos, para ele mesmo, mas a impunidade estimula esse indivíduo a praticar o ato, porque ele é capaz de ‘pesar’ os benefícios e revezes que a ação ilícita pode trazer”.



Virada da infância

Já João Augusto Figueiró, médico e psicoterapeuta do Hospital das Clínicas da USP, corrobora em muitos aspectos com a colega forense, mas acredita em uma causa multifatorial e, principalmente, em menos determinismo.

“A corrupção política, policial, tem a ver com a formação insuficiente da moralidade, mas não necessariamente com a presença de um distúrbio de personalidade. As práticas corruptas normalmente são realizadas por indivíduos com falhas nos ditos ’sentimentos morais’, na ética e na preocupação pelo bem-estar alheio”.

Figueiró explica que a região do cérebro responsável pelos sentimentos morais é “o chamado ‘cérebro moral’, que é composto pelo lobo pré-frontal, pelo sistema límbico e por uma porção do lobo temporal”. Ele atesta que, quando essas regiões sofrem um desenvolvimento adequado, na juventude, o indivíduo em questão poderá apresentar comportamentos considerados adequados.

Para ele, esse desenvolvimento se dá por meio da interação do cérebro com o ambiente, ou seja, pela interação entre o que foi herdado pelo sujeito e as pressões ambientais. O psicoterapeuta diz que esse processo ocorre principalmente nos primeiros anos de vida, quando já são observados padrões de comportamento moral.

Ele declara que “já no primeiro ano pode ser observada alguma reação ‘moral’ a expressões do sofrimento alheio. Entre os 3 e 5 anos de vida, ocorre uma virada que evidencia preocupações legítimas com o outro, sentimentos de culpa e anseio por reparações. Essa virada pode ser explicada como uma ‘virada para a empatia’, ou a capacidade de se identificar com o outro”.


Conduta e moral


De acordo com o especialista, indivíduos que não passaram por esse processo de forma saudável podem sofrer de deficiências no cérebro moral. Essa deficiência provoca o transtorno de personalidade. Segundo ele, “esse quadro resulta de uma interação negativa entre o que foi herdado pelo indivíduo (seus genes) e o ambiente, ou seja, de uma interação nociva entre sua constituição cerebral e as pressões ambientais.

Essas pressões ambientais podem ser provenientes de uma criação muito permissiva ou de limites morais e éticos muito frouxos”. Assim como a psiquiatra forense Hilda Morana, João Augusto aponta que existe um transtorno que caracteriza a maioria dos corruptos: “é o transtorno antissocial, que torna o portador um indivíduo sem limites morais e éticos, quando se trata de obter vantagens diversas. Há também o transtorno narcísico, mas geralmente este caracteriza o indivíduo extremamente egocêntrico, que nem sempre é corrupto”.

O psicoterapeuta explica que “uma característica do antissocial é a dificuldade de se identificar com os sentimentos dos outros, como os assassinos, chefes políticos cruéis ou indivíduos que desviam grandes quantidades de recursos do país, possivelmente prejudicando muitas pessoas”. Segundo ele, na infância, não existem transtornos de personalidade, propriamente ditos.

Existem transtornos de conduta, que podem, com a idade adulta, evoluir para os transtornos de personalidade. “Entre eles estão as proverbiais maldades das crianças contra os animais e as intrigas elaboradas, feitas para prejudicar colegas intencionalmente. Mas nem todos que apresentam esses transtornos de conduta desenvolvem transtornos de personalidade”, alivia. O especialista igualmente afirma não existir cura para o transtorno de personalidade antissocial.

“O grande problema é que isso não tem cura e o portador nunca busca tratamento. A única forma de combater o quadro são medidas de contenção externas, como a vigilância e a punição. Em situações onde os delitos praticados são punidos de fato, os portadores do transtorno tendem a se portar melhor”, avisa.

Para João Augusto, vale lembrar que “apesar dos problemas referentes ao transtorno antissocial, indivíduos ‘normais’ também podem ser corruptos. Tudo depende dos ambientes nos quais estão inseridos. Ambientes extremamente permissivos e com acesso a muito poder, marcados pela impunidade, que são típicos da paisagem política brasileira, normalmente favorecem o surgimento do personagem corrupto”.


Tolerância mil

Você considera aceitável que um guarda de trânsito não multe um motorista porque ele conta que cometeu a infração em função de uma emergência? Mais da metade de um total de 269 entrevistados considera que sim.

Esta foi apenas uma das situações simuladas pela professora Rita Biason, professora da Unesp, do Campus de Franca, cientista política e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Corrupção, e por colegas durante uma pesquisa realizada com estudantes universitários de três instituições de ensino superior do Estado de São Paulo que buscou avaliar o impacto da corrupção e a percepção dos universitários sobre o tema e ainda seus valores em relação ao assunto.

O exemplo é um caso de suborno em que há implicação emocional. Os pesquisadores afirmam no artigo publicado em 2008 na revista Probidad que quando se trata de questões pessoais, o público tende a demonstrar maior tolerância. Por outro lado, muitas pessoas mostram-se mais sensíveis à corrupção que envolve órgãos públicos, principalmente no que se refere ao nepotismo e à compra de votos.

Entretanto, a compra de votos não é vista como algo inaceitável por todos os segmentos da população. Segundo Rita Biason, em outro estudo realizado, ela identificou que a classe socioeconômica que recebe até três salários mínimos não vê problema em trocar o voto pelo saco de cimento, pela consulta médica e outros bens ou serviços. “Isso remete à necessidade, o sujeito precisa do saco de cimento embora haja aqueles indivíduos que tripudiam o coletivo, que exageram nas solicitações e muitas vezes sem necessidade.

Essa população tem vivido um ciclo de dependência dos programas do governo - Bolsa Família, Leve Leite entre outros. São ações que acabam não resolvendo a questão, mas sim criando uma dependência e sob certo aspecto reforçando a prática de corrupção. O problema não são os programas governamentais propriamente ditos. Ocorre que perguntamos para as pessoas: você considera aceitável ou inaceitável receber uma Bolsa Família mesmo sem necessidade? A grande maioria aceita receber. Há, portanto, um dilema ético que só aparece a partir do momento em que o aguçamos”, destaca.


Público e privado

Mas, segundo Rita, o principal fato verificado na pesquisa é que todas as classes sociais praticam corrupção. “Temos dificuldade de dizer ‘não’ à corrupção no Brasil porque não conseguimos distinguir o público do privado. Os exemplos que temos tido ao longo dos anos reforçam a ideia de que o público é algo que pertence ao indivíduo, e somente ele pode usufruir. A forma como a maioria dos agentes públicos - eleitos ou não - se comporta no Brasil, especificamente sobre a ‘coisa pública’ é lamentável e contribui para reforçar esta situação”, afirma.


Falta de pai


Para Laura Ward da Rosa, membro titular da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre, psicanalista e professora do Curso de Pós-graduação em Psicanálise e Educação da UniRitter, de Porto Alegre, a corrupção sempre existiu, porém no mundo contemporâneo ganhou traços mais visíveis e sua manutenção está relacionada a um déficit de atuação das instâncias paternas.

Ela afirma que a saída da mulher para o mercado de trabalho foi um dos fatores que corroborou para uma mudança na estrutura familiar. “Há uma grande perda de limites na situação atual, até mesmo no campo da política. A família de hoje ganhou certo espraiamento com relação à questão da autoridade, as crianças opinam sobre coisas que não devem opinar, a adolescência se antecipou e seu final foi retardado.

Há uma perda de autoridade e falta de limites que contribuem para a criança crescer pensando que pode tudo. Pode escolher tudo: brinquedo, alimento. Tudo é muito liberal, sem um critério do mais conveniente e adequado a cada faixa etária. Há uma perda de valores ao longo do processo de desenvolvimento desde a infância, passando pela adolescência e chegando à vida adulta. As relações amorosas são muito frágeis, as pessoas não querem se comprometer. Não há criação de um vínculo firme, seguro. As pessoas não se comprometem no trabalho, na vida amorosa, na política e tampouco na educação”, afirma a psicanalista.


Percepção do erro


Mas a percepção da corrupção parece ainda estar relacionada a outros fatores. Segundo Eduardo Salcedo-Albarán, filósofo pela Universidad del Rosario, Bogotá, Colômbia, e coordenador da área de Metodologia do Método - Transdisciplinary research group on social sciences -, a identificação de uma vítima de um crime público de corrupção exige a elaboração de relações causais complexas por parte do cérebro “Em alguns crimes é fácil identificar a vítima, e quando é o caso, uma relação causal simples permite ligar o crime atual à vítima.

É chamado de ‘fácil’, porque o cérebro tem de conectar poucos eventos para conectar o crime à vítima. Por exemplo, se você está andando em uma rua e vê que uma pessoa foi baleada e, momentos depois, essa mesma pessoa morre - você apenas precisa ligar os dois eventos. O cérebro é muito eficiente quando conecta poucos eventos.

Além disso, quando conectamos um par de eventos envolvendo a percepção de emoções, o cérebro reage muito rápido, também com respostas emocionais originadas em áreas emocionais. Elaboração de relações causais simples sobre reações de empatia são geralmente automáticas, mas não relacionadas com capacidades cognitivas sofisticadas. Aquelas áreas emocionais, aquelas do cérebro primitivo, reagem mais rápido do que áreas relacionadas a capacidades cognitivas de alto nível, como lógica rígida e argumentação.

Nesse sentido, em crimes públicos de corrupção, essas áreas relacionadas com capacidade cognitiva devem ser usadas. Por exemplo, se você paga um suborno, não está claro quem será afetado pelo seu ato e, por isso, é fácil pensar que não há vítima. No entanto, se pensar cuidadosamente, usando capacidades cognitivas e elaborando uma relação causal complexa, você achará a vítima do seu crime”, explica Eduardo.

Segundo o filósofo, existem basicamente duas grandes áreas no cérebro: o interior do cérebro, chamado de cérebro primitivo, e o neocórtex. Assim, enquanto emoções e sentimentos são originados no cérebro primitivo, o córtex externo ou neocórtex - área que apareceu mais recentemente na evolução do Homo sapiens - está relacionado à racionalidade, lógica, argumentação e, em geral, às capacidades cognitivas.



Neurônios espelho


Eduardo explica que além desses processos causais cerebrais, acredita que haja outro mecanismo envolvido: a inativação de neurônios espelhos. “Na verdade, é uma questão empírica que ainda precisa ser confirmada por exames de imagem”, diz. O pensador explica que testou a hipótese de que neurônios espelho relacionados à empatia e a emoções sociais não são ativados quando ocorre um crime de corrupção pública.

Para tanto, ele apresentou relatos de corrupção para um grupo de pessoas e analisou suas reações. “Quando liam uma história pequena de corrupção e não dávamos informação sobre as vítimas, elas tendiam a pensar que o ato de corrupção não estava completamente incorreto em termos morais, precisamente, porque ‘ninguém estava sendo prejudicado’.

Mas quando dávamos informações sobre a pessoa que estava sendo prejudicada pelo ato de corrupção, as pessoas tendiam a dizer que aquela ação é moralmente incorreta. Em termos gerais, quanto mais se sabe sobre a pessoa em particular que está sendo prejudicada pelo ato, mais neurônios espelho relacionados à empatia e a emoções sociais provavelmente serão ativados”, considera


O que os olhos não veem…


Eduardo diz que emoções mais poderosas de empatia social surgem quando se pode ver a vítima e, mais forte ainda, se é possível ver a face da vítima. Ele conta que o psicólogo Paul Slovic, do Decision Research Institute, tem estudado essa questão para genocídio e tem observado que mais emoções de empatia surgem quando você conhece sobre, por exemplo, um menino que deve ser resgatado, quando vê sua face e sabe sobre sua vida, do que quando lhe contam que 20 pessoas foram assassinadas.

O pesquisador explica que, emocionalmente, não somos sensibilizados pelo número 20 tanto quanto somos sensibilizados ao ver a face do menino. Para Eduardo, há uma carência de estudos que relacionem corrupção com neurociência. Em sua opinião, cientistas sociais e neuropsicologistas deveriam trabalhar em conjunto.

Entretanto, ele destaca que cientistas sociais geralmente pensam que a inclusão de genes, cérebro e biologia no entendimento dos comportamentos humanos pode levar ao determinismo biológico ou eliminar o poder das variáveis culturais.


Cultura da impunidade?


Segundo a cientista política Rita Biason, a Carta de Pero Vaz de Caminha já continha indícios de corrupção, pois o autor pede emprego ao rei para um parente. Ela diz que no Brasil Colônia também há vários relatos do crime na obra Arte de Furtar. Entretanto, considera imprudente demonstrar que a corrupção no Brasil é um dado histórico.

“Se for esta a lógica, não podemos fazer mais nada, teremos uma situação de imobilismo, passividade e aceitação. Dizem que há uma cultura da corrupção, mas não creio nisso. Para mim, há uma cultura de impunidade”, destaca. Para a professora, o ponto mais vulnerável hoje para a manutenção da corrupção é o Judiciário.

“Há uma dificuldade muito grande para criminalizar a corrupção, ou seja, demonstrar por meio de provas o ato corrupto”, diz. Nesse sentido, Rita afirma que o Ministério Público de São Paulo, por exemplo, hoje consegue condenar mais agentes públicos eleitos por meio da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) do que pelo Código Penal. “Isso porque pela LIA, as provas costumam ser mais evidentes e juridicamente eficientes.

No Código Penal, há algumas vulnerabilidades que dificultam a condenação”, afirma. Para ela, o ajuste nesse dispositivo iria agilizar a criminalização e diminuir a sensação de impunidade entre a população. Entretanto, a pesquisadora ressalta que a corrupção não é eliminada. “Este problema estará apenas sob controle, não há forma de suprimi-lo. Os países desenvolvidos não são menos ou mais corruptos do que o Brasil, apenas possuem mecanismos de controle eficazes e punição rápida.

Em geral, na América Latina podemos observar que a década de 1990 trouxe mudanças importantes. Se tomarmos o Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparency International é possível observar avanços e recuos da corrupção na Colômbia, na Costa Rica, no Uruguai, na Argentina e no Chile. São países que passaram por problemas semelhantes aos do Brasil com governos militares seguidos de democracia”, considera.

Rita lembra que o pesquisador Treisman afirma que em novas democracias, as práticas de corrupção somente serão superadas após 40 anos de Estado democrático. “A boa notícia é que já vivemos 20 anos dos 40. O aprimoramento significa a criação de instituições capazes de controlar os processos internos, como tribunais de justiça, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Tribunal de Contas da União (TCU) e conselhos e comissões de ética. Eu sou otimista porque vejo muitos países em que não há nem divulgação dos casos de corrupção e nem movimentação para investigar e denunciar atos ilícitos. Nesse sentido, nós avançamos muito”, destaca


Fonte: Revista Psique

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